Mas, quando este homem tem a barba feita e tem título de cientista, falando exatamente o mesmo que o barbudo acima, mas trocando os lados, ele vende livros. Muito livros. E dá entrevistas nos melhores jornais do mundo. E é respeitado.
Pronto, esse é Richard Dawkins. Não consegui ler o seu livro “Deus, um delírio” até o fim por duas razões: 1) estou tentando manter certa higiene mental e 2) o seu livro é um conjunto de argumentos auto-contraditórios que dá dor de cabeça em qualquer pessoa sensata. Dawkins tenta provar que qualquer tipo de crença em Deus é infundida e nociva. O mais irônico é que Richard combate o tipo de fundamentalista que ele mesmo se torna. Tal qual um evangelista, Dawkins prega a seus devotos do ódio a Deus, os quais se deliciam com o bombardeio retórico e erguem as mãos, prazenteiros:
Aqueles que acreditam que a evolução biológica pode ser conciliada com a religião são desonestos! Amém!
Eles pertencem à “escola de evolucionistas de Neville Chamberlain”! São conciliadores! Amém!
Os verdadeiros cientistas rejeitam a fé em Deus! Aleluia!
O Deus em quem os judeus acreditavam nos tempos do Antigo Testamento é um pedófilo psicótico! Amém! Diga a eles, irmão!
No capítulo 4 Dawkins trata de refutar argumentos a favor da existência de Deus. Sabe o que é mais irônico: a maioria desses argumentos não é sequer objeto de discussão. Subindo no pedestal da arrogância, ele se enrola todo. Fica muito claro que desconhece vários conceitos filosóficos básicos, fazendo ironias tontas, que só mostram a sua inépcia para o assunto.
Pior é que quando parece que Dawkins ganha o prêmio da insensatez, ele se auto-supera: ele roda o seu livro em torno do “Grande Argumento”. O tal argumento é batizado como “da improbabilidade”. Em suma o argumento diz o seguinte:
“Qualquer entidade capaz de criar (ou projetar) algo complexo de forma inteligente é necessariamente mais complexa que sua criação (ou seu projeto). A complexidade é inversamente proporcional à probabilidade de existência. Deus é o mais complexo de todos os seres, afinal é criador de todas as coisas. Logo, Deus é improvável”.
De onde ele tira isso? Como e quando é válida a relação entre probabilidade e complexidade? Realmente esta é uma relação para lá de discutível. Mas Dawkins tira esta conclusão através da seleção natural. No processo gradativo da seleção natural, um número enorme de eventos com probabilidades até razoáveis formam um caminho para a geração de um ser complexo. Imagina-se que um ser mais complexo tenha um maior número de passos dentro do processo; logo, é mais improvável. Mesmo dentro da seleção natural esta é uma afirmação fraca, mas não é esse o ponto que me chamou a atenção. O que me pareceu muito estranho é o seguinte: Dawkins considera que Deus está submetido à seleção natural?
Ele mesmo responde: “qualquer inteligência criativa, de complexidade suficiente para projetar qualquer coisa, só existe como produto final de um processo extenso de evolução gradativa”.
Ou seja, o autor postula que se Deus existe e criou alguma coisa, Ele está submetido ao processo de seleção natural. E se está submetido, é o mais improvável dos seres. Por que ele postula isso? Porque decidiu que Deus é assim e pronto, e quem não tem fé na palavra de Dawkins é porque é obscurantista e acredita em bruxas. Mas um deus submetido à seleção natural? Que deus é esse, pelo amor de Deus?
Mais a parte mais legal está na página 80: Numa gradação de um a sete que vai da crença absoluta na existência de Deus até a certeza absoluta de que Deus não existe, Dawkins admite que está na sexta posição ("tendendo para a sétima"): "Probabilidade muito baixa [de que Deus exista], mas que não chega a ser zero. Ateu de facto. 'Não tenho como saber com certeza, mas acho que Deus é muito improvável e levo minha vida na predisposição de que ele não está lá." Então por que o delírio do título? Devia ser "quase um delírio" ou "muito provavelmente um delírio", como disse o brilhante Ali Kamel.
No livro, Dawkins escreve conceitos procurando defender a idéia de que a ciência prescinde de Deus para explicar os fenômenos naturais. Em parte ele pode ate ter razão. Tem gente que acredita assim e nem por isso são ateus. Francis Collins e Alister McGrath que o diga. Isso é uma coisa. Outra, diversa, é tentar "provar" cientificamente que Deus não existe. O resultado não é ciência, não é teologia, é um somatório de argumentos que não levam a lugar algum.
Um comentário:
Se não me engano, o trecho "Aqueles que acreditam [...]
Os verdadeiros cientistas rejeitam a fé em Deus! Aleluia!" é do livro "O Delirio de Dawkins", certo?
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